quarta-feira, 18 de julho de 2007

TRAPO



O dia deu em chuvoso.
A manhã, contudo, esteve bastante azul.
O dia deu em chuvoso.
Desde manhã eu estava um pouco triste.
O dia deu em chuvoso.

Bem sei: a penumbra da chuva é elegante.
Bem sei: o sol oprime, por ser tão ordinário, um elegante.
Bem sei: ser suscetível às mudanças de luz não é elegante.
Mas quem disse ao sol ou aos outros que eu quero ser elegante?

Dêem-me o céu azul e o sol visível.
Névoas, chuvas, escuros - isso tenho eu em mim.
Hoje quero só sossego.
Até amaria o lar, desde que não o tivesse.
Chego a ter sono, da vontade de ter sossego.
Não exageremos!
Tenho efetivamente sono, sem explicação.
O dia deu em chuvoso.

Carinhos? Afetos? São memórias...
É preciso ser-se criança para os ter...
Minha madrugada perdida, meu céu azul verdadeiro!
O dia deu em chuvoso.

Boca bonita da filha do caseiro,
Polpa de fruta de um coração por comer...
Qunado foi isso? Não sei...
No azul da manhã...

O dia deu em chuvoso.

Álvaro de Campos

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