O escritor não escreve sobre si mesmo.... Frase que continua rondando minha criação. Mas hoje não quero escrever sobre pessoas, nem escritores e nem criação. Porque também amor não escreve sem a presença do eu subjetivo. Somente Camões conseguiu tão bem em seu soneto eterno. Mas também não quero falar sobre Camões. Quero falar de quarta-feira à tarde quando há pessoas em suas casa, em seus apartamentos, em seus quartos, num instante de férias semanais. Porque não trabalhar num dia de meio de semana é o que há de prazer. E esse sei que ficará eterno. Hoje assiti a um filme que há muito não repetia nas Sessão da Tarde. Sabrina na versão atual com Harrison Ford e Julia Ormond... Hum.... acho que esqueci o nome dos atores. Sei que é um filme mágico, mais mágico ainda é o filme original em que Audrey Hepburn é a protagonista, filha de um motorista de uma família rica, vai para Paris aprender os serviços de "un grand chef de la cuisine française". Versão ou não, é um filme que sempre me encantou. Acabou a sessão, sai para as tradicionais caminhadas das quartas. Pensando, como sempre, pelos caminhos, como um filme de amor pode nos fazer acreditar no impossível. Por mais que tudo esteja desalentador, um bom de filme de amor refresca-nos a alma como tomar uma cerveja num barzinho no final da tarde. Apreciar as pessoas, fotografar de palavras as faces, as expressões que surgem pelas ruas. O final da tarde, as suas cores, a mudanças de estação e tudo que envolve o sentimento de amor por alguém ou por nós mesmos. Mas não é isso ainda que queria dizer.
Continuei pelo mesmo caminho de 12 anos atrás, na mesma bat hora, no mesmo bat canal. E a Lua estava lá. Numa certa altura, andava de frente para ela, laranja, vindo em minha direção. Eu ia ao seu encontro como boas amigas. Ela e eu. Cheguei à sua casa, nos vimos mais de perto, então combinamos um passeio, eu e ela. Descemos a grande avenida, do outro lado o pasto, a porteira e a noite inteira... Descemos ombro a ombro, conversavamos e ela me contava sobre o vento e sobre o som dos ruídos do vento no capim seco. Alguns momentos eu parava e apontava:"olha!" Eu via o céu e a noite imensa descendo aos poucos sobre as montanhas que circundam a cidade. Conversávamos, nos confessávamos. Eu disse a ela que andava apaixonada por um fantasma, que vem todas as noites nos meus sonhos, nos meus encantamentos com o vento. Rodopiava e o vento me afagava, quente, às vezes frio, e eu sentia alegria. Eu conversando com a Lua. Não sou Ismália. Não enlouqueci. E o fantasma estava também presente. Ali, no fim da rua, entre as ramagens. A música suave da sua voz, da sua poesia, da sua arte. Estávamos todos ali, ele, a Lua e eu.
Continuei minha caminhada e, chegando em casa, olhei a cidade e a Lua já bem alta.
Minhas últimas palavras para hoje: o amor é um sentimento sublime, simples, mas inventam para ele roupagens de luxo, formas arredondadas, jóias, pompas, manipulações diversas, estilos, jogos... e, no fim, o que resta mesmo é a amarga idéia de não tê-lo vivido em sua intensidade e sem máscaras. E não há mais tempo. Ponto final.